sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

BRAGABÁ, UMA CRÕNICA


Bragança: Marabá é uma cidade submersa cuja imagem vítrea permanece no
côncavo de meu cristalino de vinte e sete anos. E de onde emerge a pérola do Caeté tal
qual a Mesopotâmia de meia década. Se me não canso de emparelhá-las é por ser uma a
matriz intacta de que fala Ítalo Calvino e a outra a que nasce e traz à tona a primeira. E
assim passei três semanas em Bragabá.

Dez minutos de caminhada rodeado por silêncios: passos rápidos em pisos
irregulares, tempo quente, vento brando, calor gostoso de sol de sete e meia da manhã.
A torre da telepará marcando o caminho: inerte. Próxima, inalcançável; riscando azul e
algodonévoas. UFPA descalçada, poeira e pó da entrada (sem pórtico) até a sala de aula.
Camaleões nas árvores cagando e caindo sobre cadernos e alunos. Prédio ad aeternum
em construção e Letras buscando espaço...

Mulheres nas portas, homens nas ruas, velhos nas calçadas, motos e motos,
bicicletas... crianças correndo, jogando bola, rindo de nada e de tudo. Praça e praça:
mini-bugs, pipoca, sanduíches. Praça, igreja, orla e rio. Praça: lazer. Praça: trabalho.
Praça: orla, bares, bares e barracas de tacacá.

Ontem a polícia prendeu um bandido: puseram no carro com vidro sem fumê e
na frente batedores em businaços. Disseram-me (eu me ouvi dizendo para mim) que
aqui isso é comum. A população petrificada se recongela idêntica a outra jazente na
retina fatigada. E explodem apupos e aplausos desmanchando-se como as estátuas
fossilizadas (na memória).

Ontem deram-me uma carona. Passaram nas bordas da feira. Um bêbado, ou
doido, ou apenas um transeunte distraído. Aos meus ouvidos e de meu olvido: busina e
palavras, mas o homem apenas adeja até a borda da rua.
Ontem!?
Abílio Pacheco

Nenhum comentário:

Postar um comentário