Abro aqui um espaço que gostaria fosse feito pelo amigo internauta (ou peregrino).Vou abri-lo comentando minha leitura atual. Estou lendo, poesias escolhidas da poeta (ou poetisa como queiram) Gabriela Mistral, que ganhou um dos prêmios Nobel de literatura concedido pela Academia Sueca de Literatura..
É um volume antigo da Coleção Biblioteca dos Prêmios Nobel, que apesar de ser um calhamaço de mais de duzentas páginas a leitura não se torna enfadonha nem tediosa, pela expressividade dos poemas de Gabriela.
É uma leitura que recomendo, que em muito contribuirá para seu crescimento intelectual e espiritual. Deixo com você na seqüência dois belos poemas da autora, chilena...Prefiro não comentar seus poemas que não é essa a intenção desse espaço...é preferível deixar fluir na alma do (como chamaria um leitor virtual?).Leia e boa viagem ao planeta poesia.
GOTAS DE FEL
Não cantes: sempre fica
Não cantes: sempre fica
à tua língua apegado
um canto: o que faltou ser enviado.
Não beijes: sempre fica,
por maldição estranha,
o beijo a que não chegam as entranhas.
Reza, reza que é bom; mas reconhece
que não sabes, com tua língua avara,
dizer um só Pai Nosso que salvara.
E não chames a morte de clemente,
porque, na carne que a brancura alcança,
uma beirada viva fica e sente
a pedra que te afoga
e o verme voraz que te destrança.
COPLAS
Trad. de Ruth Sylvia de Miranda Salles
A tudo, em minha boca,
um sabor de lágrimas se acresce;
a meu pão cotidiano, a meu canto
e até à minha prece.
Eu não tenho outro oficio,
depois do silente de amar-te,
que este oficio de lágrimas, duro,
que tu me deixaste.
Olhos apertados
de candentes lágrimas!
Boca atribulada e convulsa,
em que prece tudo se tornava!
Tenho um vergonha
deste modo covarde de ser!
Nem vou em tua busca
nem consigo também te esquecer!
E há um romoer que me sangra
de olhar um céu
não visto por teus olhos,
de apalpar as rosas
sustentadas pela cal de teus ossos!
A CHUVA LENTA
Trad. de Ruth Sylvia de Miranda Salles
Esta água medrosa e triste,
como criança que padece,
antes de tocar a tierra,
desfalece.
Quietos a árvore e o vento,
e no silêncio estupendo,
este fino pranto amargo,
vertendo!
Todo o céu é um coração
aberto em agro tormento.
Não chove: é um sangrar longo
e lento.
Dentro das casas, os homens
não sentem esta amargura,
este envio de água triste
da altura;
este longo e fatigante
descer de água vencida,
por sobre a terra que jaz
transida.
Em baixando a água inerte,
calada como eu suponho
que sejam os vultos leves
de um sonho.
Chove... e como chacal lento
a noite espreita na serra.
Que irá surgir na sombra
da Terra?
Dormireis, quando lá foram
sofrendo, esta água inerte
e letal, irmã da Morte
se verte?