quinta-feira, 17 de maio de 2012

NUDEZ

CARLOS DRUMOND DE ANDRADE

Não cantarei amores que não tenho
e,quando tive, nunca celebrei
Não cantarei o riso que não rira
E que se, risse ofertaria  a pobres
Minha matéria é o nada
Jamais ousei contar algo de vida
Se o canto sai da boca ensimesmada
é porque a brisa o trouxe, e o leva a brisa
nem sabe a planta o vento que visita

Ou sabe? Algo de nós acaso  se transmite
mas tão disperso, e vago, tão estranho
que, se regressa a mim que o apascentava
O ouro suposto é nele cobre e stanho
Estanho e cobre
E o que não é maleável deixa de ser nobre
nem era amor aquilo que se amava

Nem era dor aquilo que doía
ou dói, agora quando se foi?
Que dor se saber dor, e não se extingue?
(Nâo cantarei o mar:que ele se vingue
de meu silêncio, nesta concha)

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